quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Pensando a Mediação Cultural

Este texto é um fluxo de pensamento, sem muita preocupação de formatação conforme um modelo acadêmico.São idéias, geradas em função de um curso para professores, que ministrei na 8ªBienal do Mercosul, em julho de 2011. (Diana Kolker Carneiro da Cunha)

A mediação cultural realizada em espaços expositivos é uma proposição pedagógica. Desenvolve-se através de diálogos, debates e da experiência com o objeto, com a exposição e com o espaço que a abriga. Esta proposição se aproxima das teorias construtivistas de aprendizagem, pois os sujeitos envolvidos são ativos na construção da interpretação e leitura dos objetos em questão. Compreende-se interpretação como uma operação mental e sensível que visa à produção de sentido e à criação de significados, formulados a partir da relação entre o objeto em questão (que não é necessariamente um objeto material) e os nossos conhecimentos prévios, nossos percursos de vida, nossas experiências anteriores, enfim, de nossa bagagem subjetiva. Dessa forma, a interpretação é sempre singular, portanto a visita mediada também é. Ela não pode ser reproduzida e não deve ser reprodutiva.


Partir da bagagem pessoal do público pode parecer uma tarefa difícil para apenas um encontro de poucas horas. Por vários motivos: Primeiramente, porque na maioria dos casos, se trata de um grupo de pessoas, portanto de uma multiplicidade de histórias, saberes, experiências. Segundo, em função do próprio tempo de contato, que poderia dificultar essa troca. Até mesmo para um professor em sala de aula, que tem um contato diário com os estudantes, a grande quantidade de alunos, o tempo e a necessidade de dar conta dos conteúdos curriculares muitas vezes dificulta essa relação. No entanto, é ao longo da própria visita, em fluxo, através dos comentários e questionamentos do grupo e das respostas às questões lançadas pelo mediador, que se forma esse espaço onde tal bagagem pessoal será inevitavelmente constitutiva da mediação. É, portanto, um trabalho de grande sensibilidade e atenção. As interpretações individuais podem, dessa maneira, contribuir mutuamente para a ampliação da percepção do grupo como um todo. O mediador será o responsável por dar forma a essa trama. No entanto, não se trata de tentar produzir consenso, ou extrair dessa polifonia a conclusão sobre a interpretação mais correta. No caso da arte contemporânea, muitos trabalhos traçam relações com diversas áreas do saber, com diversas dimensões da vida na contemporaneidade. Portanto, estão abertas a múltiplas apropriações e significações, se tornando incompatível qualquer tentativa de estabelecer uma categorização entre interpretações mais ou menos verdadeiras. Claro, que se alguém produzir uma relação, ou tecer um comentário muito distanciado da obra, o mediador pode ajudar a conduzir para um aprofundamento ou uma revisão da ideia. Mas isso não deve ser feito de forma a censurar ou inibir a participação da pessoa. Nesse sentido, um dos papeis do mediador, ou educador, é possibilitar que o grupo crie suas leituras e interpretações, agregando novas informações, relacionando as falas dos envolvidos, aprofundando ou problematizando as questões colocadas, ou mesmo, criando desvios, que permitam o alargamento dos conhecimentos de cada sujeito. Assim sendo, respeitar a bagagem subjetiva de cada um e partir de seus conhecimentos prévios, não significa permanecer imóvel neles. Se assim fosse, condicionaríamos os nossos estudantes a permanecerem no mesmo lugar.

O percurso traçado durante a mediação não é um percurso iniciado ou acabado. É parte de algo maior, é parte de uma rede, ou um rizoma. Rizoma é um tipo de caule, que pode ser subterrâneo ou aéreo e que se espalha em várias direções. Qualquer ponto do rizoma pode ser conectado a qualquer outro ponto e pode ser rompido ou retomado, possui entradas e saídas múltiplas. O Rizoma não é linear, não é vertical, não é binário. Sua configuração não permite uma ordenação teleológica, mas à multiplicidade. Deleuze e Guatarri utilizaram o rizoma para formular um conceito muito importante na filosofia. A dupla tomou um elemento da botânica para pensar filosofia. Nós o tomamos para pensar a prática educativa da mediação. Por quê? Pensar a mediação da arte de forma rizomática, significa estar sensível a multiplicidade de entradas e saídas para interpretar um trabalho de arte, significa se mover junto ao pensamento do público ou levá-los para novas direções, sem negar outros caminhos possíveis, significa também, pensar a própria mediação como um ponto desse rizoma, que se conecta com as experiências anteriores à visita da turma, que são ativadas no percurso, e que – espera-se- se ligarão a futuras experiências, criando marcas, para além daquele momento específico, marcas que cada aluno possa levar para sua vida.

Referência:
DELEUZE, Gilles e GUATARRI, Felix. Mil platôs - capitalismo e esquizofrenia, vol. 1; Tradução de Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa. —Rio de janeiro: Ed. 34, 1995.

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